Roberta Jacobson disse que Obama lamenta dano causado à relação
com Brasil
Uma importante porta-voz do governo americano para as Américas
disse nesta sexta-feira que os EUA "não realizam espionagem industrial" e
enfatizou que o presidente Barack Obama "lamenta" o dano causado pela espionagem
da Agência Nacional de Segurança (NSA, na sigla em inglês) sobre o Brasil.
Em uma conversa com jornalistas, a secretária-assistente de Estado para a
região, Roberta Jacobson, indicou que a NSA continuará coletando inteligência
para garantir a segurança dos americanos "da mesma forma que muitos governos em
todo o mundo", mas frisou que esta coleta terá de obedecer ao "princípio claro"
de servir à segurança nacional.
"O presidente foi muito claro em determinar que olhemos para o tipo de
inteligência que coletamos e nos asseguremos de que ela realmente siga as
orientações de ser importante para os EUA", afirmou Jacobson, que está em Nova
York para participar da Assembleia Geral da ONU.
"Ele também deixou claro que está preocupado com a transparência, e que
queremos trabalhar com nossos aliados para garantir que esse tema não atrapalhe
outras áreas em que queremos avançar – e precisamos avançar – também pela nossa
segurança e nossa segurança econômica."
A representante respondia a perguntas específicas de jornalistas sobre duas
pré-condições colocadas pela presidente Dilma Rousseff para retomar o processo
de elevar a relação bilteral a um novo patamar de importância: um pedido de
desculpas e a garantia de que a espionagem não volte a ocorrer.
Sobre o primeiro tema, Jacobson frisou que o presidente Obama "lamenta" as
consequências das revelações feitas pelo ex-empregado da NSA Edward Snowden.
Ela também garantiu que as preocupações manifestadas por governos
estrangeiros – inclusive pela presidente Dilma Rousseff em seu discurso na ONU
na terça-feira – foram ouvidas "alto e claro".
Mudanças na NSA
Dilma Rousseff disse em termos fortes que a espionagem americana constitui
"um caso grave de violação dos direitos humanos e das liberdades civis", de
"invasão e captura de informações sigilosas relativas a atividades empresariais"
e "sobretudo, de desrespeito à soberania nacional".
Em sua intervenção logo após Dilma, o presidente Obama fez apenas uma rápida
menção ao processo de revisão das "capacidades" militares e de inteligência dos
EUA, ressaltando logo depois que, por causa delas, "o mundo está mais seguro
hoje que cinco anos atrás".
"Nós não fazemos espionagem industrial. Não coletamos inteligência para
empresas privadas nos EUA", disse nesta sexta-feira a secretária-assistente
Roberta Jacobson.
Segundo ela, as denúncias levaram o governo americano a adotar um processo de
revisão que é tanto interno, de revisão dos procedimentos de coleta de
inteligência, quanto externo, de diálogo com os países afetados.
Como parte dessa revisão, ela disse, os EUA vão estabelecer "uma série de
princípos" para equilibrar as preocupações americanas de segurança com as
questões de privacidade colocadas pelos países aliados.
Mas até agora não há detalhes sobre em que consistiria a revisão prometida
por Obama. Como o americano havia, porém, prevenido Dilma que se trata de um
processo que durará meses, a presidente brasileira resolveu adiar – sem nova
data – a visita de Estado que faria a Washington em outubro.
Uma nova legislação para aumentar a transparência e limitar o alcance da
espionagem da NSA começou a ser debatida pela Comissão de Inteligência do Senado
americano na quinta-feira, mas o projeto diz respeito apenas à privacidade de
americanos.
A legislação requereria, por exemplo, que a NSA a tornasse públicas as vezes
em que tenha acessado a base de dados telefônicos de cidadãos, reduziria o tempo
– atualmente cinco anos – que a agência pode manter esses dados e forçaria o
órgão a submeter a uma corte secreta a lista de telefones espionados, com os
devidos motivos explicados de forma substancial.
A lei também estabeleceria um advogado constitucional para argumentar contra
a posição do governo junto à corte secreta nos casos em que existem liberdades
constitucionais envolvidas.
"Quando governos amigos começam a questionar a sua relação com a comunidade
de inteligência americana, há implicações sérias para a segurança nacional",
disse o senador democrata Ron Wyden.
Mas ele endossou a posição dominante entre os senadores de manter o programa
de coleta de dados, fazendo modificações para equilibrar os interesses de
segurança nacional dos EUA com as preocupações com privacidade levantadas por
cidadãos e países estrangeiros.
"Nossa legislação quer emendar os principais causadores de dano e provar que
nossas liberdades e nossa segurança não são mutuamente exclusivas."
Na ONU, Obama disse que mundo 'é mais seguro' por causa de
atuação dos EUA
Desconfiança
No caso da relação Brasil-EUA, as denúncias de espionagem tiveram o efeito
imediato de inviabilizar a visita de Estado de Dilma a Washington.
No longo prazo, pode-se instalar na relação uma desconfiança que inviabilize
também iniciativas que impliquem em compartilhamento de informações – essenciais
para a cooperação em áreas sensíveis, como defesa e segurança.
A secretária-assistente de Estado disse que, concomitantemente à revisão de
procedimentos da NSA, os EUA têm interesse em continuar trabalhando com o Brasil
em uma agenda que ela qualificou de "substancial" e "multifacetada".
Nesta sexta-feira, o secretário de Estado, John Kerry, e o ministro das
Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo Machado, tiveram sua primeira
reunião desde que Figueiredo assumiu a pasta.
Segundo Jacobson, eles discutiram a crise na Síria e a reunião da Comissão
para Proibição de Armas Químicas que vai detalhar os planos para a eliminação do
arsenal químico sírio.
No plano bilateral, os representantes trataram de "diálogos que já temos e
que consideramos importantes", de acordo com Jacobson. Ela citou como exemplo o
Fórum de CEOs, liderado pelo setor privado mas facilitado pelo governo, o
diálogo energético e um plano de ação para eliminar a discriminação racial em
ambas sociedades.
"Foi uma conversa ampla. Um encontro excelente em um relação na qual você
nunca pode tratar de todos os temas em uma única reunião, porque ela é tão
multifacetada", afirmou.